STF pode unificar posição sobre RIF por encomenda



PENDÊNCIA ETERNA

Dois julgamentos na 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal podem unificar a posição da corte sobre a validade de relatório financeiros produzidos por encomenda, a pedido da polícia judiciária ou do Ministério Público.

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STF pode pacificar posição sobre RIF do Coaf por encomenda

O tema está em análise em um Habeas Corpus (HC 249.246) e uma reclamação (Rcl 74.362) referentes ao mesmo caso. O relator é o ministro Luiz Edson Fachin. Pediu vista no julgamento virtual o ministro Dias Toffoli.

Esses relatórios apontam movimentações financeiras suspeitas e são produzidos pela própria Receita Federal ou pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

Não há dúvidas de que o compartilhamento, de ofício, dessas informações sigilosas para fins penais, sem autorização judicial prévia, é constitucional, como julgou o Plenário do STF em 2019.

Até o momento, a 2ª Turma do STF sustenta que, quando essas informações seguem o caminho inverso — são solicitadas pelo órgão de investigação ao órgão de inteligência, que as produz por encomenda — é necessário obter autorização judicial antes.

A posição diverge de como a 1ª Turma do STF trata a questão. Ela entende que o compartilhamento de relatórios a pedido da autoridade é válido, sem qualquer necessidade de passar por controle prévio do Judiciário.

Os dois processos em julgamento atacam decisões monocráticas do ministro Fachin, em que ele valida o uso de relatório produzido por encomenda, tendo como base precedentes da 1ª Turma do Supremo.

Os recursos foram levados a julgamento na sessão virtual iniciada em 4 de abril. O relator propôs confirmar essa posição, que representaria uma mudança jurisprudencial. A vista foi solicitada pelo ministro Dias Toffoli no mesmo dia.

Relatório por encomenda

O caso analisado trata de um empresário suspeito de apropriação ilícita de valores por meio de sua empresa. Ele foi denunciado à Polícia Federal, que abriu um procedimento preliminar ao inquérito (VPI) para averiguar os fatos.

Entre as diligências iniciais, o delegado requisitou dados financeiros do investigado ao setor de inteligência da Receita Federal e foi atendido. A defesa do empresário foi ao Superior Tribunal de Justiça sustentar que isso feriu as teses do Supremo sobre o tema porque não havia inquérito formal instaurado.

A 5ª Turma do STJ, a princípio, entendeu que o compartilhamento foi válido. O julgamento ocorreu em 21 de maio de 2024. Contra esse acórdão, a defesa do empresário ajuizou Habeas Corpus no Supremo Tribunal Federal.

Mais tarde, em 25 de setembro, o colegiado do STJ mudou de posição e decidiu que o compartilhamento foi ilícito, porque o VPI não se qualifica como procedimento formal de investigação — seria, na verdade, uma fase anterior e preliminar ao inquérito.

A mudança de posição se deu em embargos de declaração. Contra esse acórdão, a Procuradoria-Geral da República ajuizou a reclamação constitucional no STF, alegando desrespeito à tese firmada pelo Plenário em 2019.

Relatórios validados

Em decisões monocráticas, o ministro Luiz Edson Fachin negou o pedido feito pela defesa e acatou os argumentos da PGR. Em 19 de dezembro de 2024, ele julgou a reclamação procedente tendo como base a decisão da 1ª Turma do STF na Rcl 70.191, em que foi cassada outra decisão do STJ sobre o tema.

Em 13 de fevereiro deste ano, Fachin denegou a ordem em Habeas Corpus já com base na decisão anterior, da reclamação, e citando como precedente a Rcl 61.944, outro caso em que a 1ª Turma do STF validou os relatórios por encomenda.

A defesa interpôs agravo contra as duas decisões. São esses os recursos que estão paralisados por pedido de vista na 2ª Turma do STF.

Vai mudar

Outro indício da possível unificação jurisprudencial sobre o tema está na Rcl 74.306, processo em que o ministro Dias Toffoli julgou procedente pedido para cassar uma decisão monocrática do ministro Messod Azulay, do STJ.

Naquele caso, Azulay concluiu que a instauração de notícia-crime em verificação (NCV) — procedimento para averiguar uma denúncia anônima — não pode justificar pedido de informações da Polícia Federal ao Coaf.

A PGR levou o caso ao STF em reclamação, na qual o ministro Toffoli concluiu que a solicitação dos dados de inteligência financeira pela autoridade policial atendeu aos parâmetros estabelecidos pelo Supremo na tese de 2019. Isso apesar de a 2ª Turma ter rejeitado a validade dos relatórios por encomenda de maneira constante nos últimos anos. Um dos casos é o HC 200.569, julgado em outubro de 2024, em que invalidou provas pedidas pelo MP à Receita Federal.

Outro caso paradigmático, mais antigo, é o do senador Flávio Bolsonaro (PL), investigado pela prática de “rachadinhas”. A 2ª Turma anulou os relatórios de inteligência financeira produzidos pelo Coaf a pedido do Ministério Público do Rio de Janeiro, em 2021.

Celeuma jurisprudencial

Como já mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, essa indefinição do Supremo Tribunal Federal sobre o tema vem causando efeitos deletérios na Justiça Criminal brasileira.

No STJ, a 5ª Turma entende que os relatórios por encomenda são válidos, desde que já exista inquérito instaurado. Já a 6ª Turma vem declarando a ilegalidade nesses casos.

A 3ª Seção, que reúne os membros dessas duas turmas, já afetou um recurso especial sobre o tema para fixar uma posição, ao menos até que o Supremo resolva de uma vez a questão. Enquanto isso, a produção pelo Coaf segue a todo vapor. Em 2024, a unidade aumentou em 14% o número deles: fez 18.762 relatórios. Isso significa, em média, 51 RIFs por dia.

Esse número se soma ao fato de que, em dez anos, o Coaf aumentou em 1.300% o número de RIFs produzidos a pedido das polícias e do Ministério Público.

Há ainda notícia de trocas de informações feitas de maneira informal, o que viola direitos dos investigados e a jurisprudência de STF e STJ. O risco é tornar o Coaf um repositório de informações para a prática de pesca probatória (fishing expedition).

HC 249.246 (STF, 2ª Turma)
Rcl 74.36 (STF, 2ª Turma)
RHC 188.838 (STJ, 5ª Turma)
Rcl 70.191 (STF, 1ª Turma)
Rcl 70.191 (STF, 1ª Turma)
Rcl 74.306 (STF, Dias Toffoli)
RHC 205.358 (STJ, Messod Azulay)
HC 200.569 (STF, 2ª Turma)





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